Reunião do Núcleo ABOI – RJ.
Local: Instituto Fernandes Figueira – IFF.
Data: 03/12/2011.
Horário: 09:00 às 13:00.
Participantes:
José Carlos
Fátima Benincaza
Antília (assistente social do IFF)
Portadores e não portadores de OI e seus familiares.
Visitantes
Tema: Qualidade de vida de adolescentes com OI em tratamento no IFF/FIOCRUZ
- Mediante ao perfil de doenças que se tem hoje no Brasil, o SUS implementou um conjunto de medidas, onde a qualidade de vida passou a ter um desfecho importante em saúde. Tratar pessoas também passou a ser uma das preocupações nesse conjunto de medidas. Hoje, por conta de novas tecnologias, há mais condições de salvar pessoas que no passado. Como será a vida dessas crianças e bebês, que só sobreviveram por causa de todo um aparato tecnológico e, com quê qualidade de vida? Mas o que é qualidade de vida? A partir da década de 90, o termo/tema qualidade de vida tornou-se comum e recorrente no mundo todo, não só entre os profissionais de saúde e no meio científico, mas também nas políticas públicas, entre políticos, no jornalismo e etc. A qualidade de vida é pensada de diversas formas como: bem estar, melhores condições de vida, enfim.
Devido as suas várias interpretações, a OMS buscou um conceito universal, que fosse aplicável a diferentes culturas. Elaborou junto a especialistas de 15 países, um grupo de trabalho chamado WHOQOL, na busca de um consenso para um conceito que expressasse a maioria. Tiveram como entendimento/consenso que qualidade de vida é um conceito subjetivo, no qual somente a própria pessoa pode falar a sua vida e o que considera importante para se ter qualidade de vida e, quais são as suas expectativas. Não há como falar pelo outro; é também consenso que qualidade de vida é um conceito multidimensional porque mesmo em diferentes culturas de diversos países há algumas dimensões da vida que todas as culturas valorizam. A saúde, por exemplo, não seria o único aspecto da vida importante para se medir a qualidade de vida. Chegou-se a um consenso que a qualidade de vida deveria ser avaliada, pelo menos, sob 3 dimensões: a dimensão física, social e psicológica.
- O objetivo geral do estudo/pesquisa: "Explorar e descrever a qualidade de vida de adolescentes com OI; investigar as dimensões da qualidade de vida dos adolescentes com OI; identificar os significados, as crenças e os valores que podem interferir na qualidade de vida dos adolescentes com OI; observar as diferentes estratégias encontradas para lidar com os desafios apresentados pela experiência da doença".
- O conceito de Qualidade de Vida utilizado para esse estudo foi o da OMS que é "a percepção que o indivíduo tem de sua posição na vida", considerando o contexto da cultura. A importância da construção desse conceito é que apesar de subjetivo e individual, ele é influenciado e influencia o meio que vivemos.
- A faixa etária considerada para o estudo foi a do ECA, entre 12 e 18 anos apesar da OMS considerar que a adolescência vai dos 10 aos 18 anos.
- O conceito de adolescência é considerado como um período de transição entre a fase de criança para a fase adulta. Muitos estudiosos já consideram a adolescência como uma fase com características próprias, sem transição. É uma fase de aquisição de papéis sociais, onde as relações familiares são modificadas com o desejo de independência e tomadas de decisões. Os amigos e colegas adquirem maior importância e o grupo tem um grande poder. Também há o desenvolvimento da sexualidade no que se refere a descoberta do corpo e dos prazeres com o corpo e não do sexo em si. A adolescência é uma fase relacionada com a auto-estima.
- Alguns conceitos de OI, conceitos também utilizados para o estudo – Enfermidade dos ossos frágeis ou doença dos ossos de cristal. É uma doença genética causada por mutações do (no) colágeno tipo 1; colágeno é uma proteína que envolve o tecido conjuntivo. A freqüência da doença é de 1 para 5/10 mil indivíduos.
Como o tratamento da OI, no IFF, considera a classificação dos quatro tipos de OI, o estudo também leva em conta essa classificação: Tipo 1 é a forma mais leve de OI; (poucas fraturas e/ou deformidades); o tipo 2 é o mais letal e os bebês em geral não sobrevivem pois são muito pequenos e frágeis; o tipo 3 é grave mas é compatível com a vida (muitas fraturas gerando deformidades); o tipo 4 é o tipo moderado da enfermidade (balaio de gatos- tudo o que não se encaixa nos demais tipos), onde estão relacionados os casos que não se enquadram os anteriores.
- O tratamento da OI: Antigamente não tinha tratamento com medicamento. Consistia em cirurgias ortopédicas corretivas e alguma reabilitação fisioterápica;
- Hoje há o consenso com medicamentos (bifosfosnados);
- O protocolo de tratamento no IFF é com Alendronato e o Pamidronato (mais estudos e mais resultados positivos);
- O IFF é um dos centros de referencia do tratamento de OI e coordenador nacional de todos os CROI’s;
- Em 2001, a ABOI ganhou na justiça o direito a implantação do tratamento de OI pelo SUS e em 2002 foi efetivado o tratamento em rede pública; Atualmente são 15 CROI’s espalhados pelo Brasil e 14 estão em funcionamento.
- Na época em que o estudo foi realizado, havia 161 pacientes cadastrados no programa de tratamento do IFF: 70 pacientes fazendo uso do pamidronato (via venosa e, o paciente, precisa de internação por três dias), 69 pacientes utilizavam o alendronato (via oral) e 22 pacientes estavam sem medicação, em acompanhamento clínico (por algum motivo).
- O protocolo de internação para tratamento adotado é baseado no protocolo canadense, pioneiro no tratamento da OI. Nele as crianças com menos de 2 anos se internam de 2 em 2 meses para administrar o medicamento e, acima de 2 anos, se internam de 4 em 4 meses para administrar o medicamento;
- O tratamento ambulatorial é baseado no modelo empírico, porque ainda não se tem um protocolo de tratamento da OI por via oral, Ele é baseado em experiências que já estão consolidadas;
Dando continuidade a apresentação do estudo em si, ele é exploratório/descritivo. Exploratório porque atualmente há ainda pouco conhecimento sobre a qualidade de vida das pessoas com OI; O que se tem, em sua maioria, são aspectos biomédicos relacionados aos estudos sobre densidade mineral óssea, ou resultados dos medicamentos, ou de cirurgias. Não existem estudos das outras dimensões da qualidade de vida dos portadores de OI.
Os Instrumentos utilizados para uma abordagem quantitativo/qualitativa foram os questionários WHOQOL (questionário fechado), demográficos, grupo focal (aspecto qualitativo) e diário de campo; Participaram da pesquisa 37 adolescentes sendo que 15 estavam em tratamento com pamidronato, 20 com alendronato e 2 em acompanhamento clínico;
- WHOQOL 100: é um tipo de questionário produzido pela OMS, criado a partir do conceito universal de qualidade de vida. Relaciona 100 questões que abordam o aspecto físico, psicológico, relações sociais, relações de independência, meio ambiente, religiosidade/espiritualidade e crenças pessoais, que influenciaram suas vidas fixando com base de resposta as "ultimas duas semanas" numa escala (desde o nada até extremamente). Este questionário foi respondido pelo grupo estudado (adolescentes);
- aplicação de questionários sócio-demograficos (elaboração própria) nos quais estão relacionados as variáveis sexo, idade, estado civil, escolaridade do pai e da mãe, renda familiar e procedência, pois existem estudos que indicam a influencia dessas variáveis na qualidade de vida das pessoas. Este questionário foi respondido pelo responsável.
- grupo focal: É uma reunião com foco, com objetivos predefinidos dado um tema. Foi uma reunião gravada, com dinâmica de grupo e perguntas chaves.
- diário de campo: onde eram feitas anotações/observações durante os atendimentos ao longo de todo o processo de tratamento, nas enfermarias e ambulatórios.
- Analise dos dados quantitativos (utilização de pacotes estatísticos) e dos dados qualitativos (utilização de análise temática);
- Resultados do estudo - Análise do perfil sócio-demografico:
Quem são os adolescentes que participaram deste estudo?
- Sexo: 56,8% do grupo é feminino;
- Idade: maior ou igual a 15 anos;
- Escolaridade: 67% do grupo faziam o ensino fundamental;
- Renda familiar: 1 a 5 salários mínimos;
- Procedência: 70% residem em outros municípios. Por ser referencia o IFF recebe pacientes de vários lugares, até do Pará. O transtorno que causa é a continuidade/comparecimento do tratamento devido aos deslocamentos (distancias).
- Tipo de OI: 51% estão no grupo 1;
- Regime de tratamento: 59% em ambulatório (alendronato);
- Escores de avaliação: (WHOQOL):
- religiosidade/espiritualidade e crenças: 77% (dimensão da vida em que estão mais satisfeitos);
- relações sociais: 73% (grupo de amigos, inserção social é uma dimensão da vida muito valorizada);
- nível de independência: 71% (meio-ambiente engloba meios de transporte, acesso a informação. É aonde encontram mais dificuldade);
Resultado obtido através de analise estatística.
- Quando se fez a comparação entre os domínios do WHOQOL com o regime terapêutico (ambulatorial ou pamidronato), os adolescentes do regime ambulatorial têm uma avaliação melhor do que o adolescente do Tipo 3 e 4 (que está em regime de internação);
- O resultado da comparação quanto ao tipo de OI, os adolescentes do Tipo 1 se consideram com uma qualidade de vida melhor que os dos Tipos 3 e 4.
Os resultados das avaliações obtidas no grupo WHOQOL, grupo focal, questionário sócio-demografico, foram agrupadas em 3 eixos temáticos:
- A OI e seus significados (como a OI interfere na vida desse adolescente)
- O adolescer diferente (como que o corpo interfere na vida desse adolescente)
- Desenvolvimento da sexualidade (temas mais discutidos, principalmente no grupo focal);
- No domínio físico: o que mais surgiu foi a dificuldade estatural, a fragilidade óssea e fraturas recorrentes. As fraturas foram relatadas como um dos maiores problemas/impedimentos com as atividades físicas (correr, jogar bola, por exemplo). No caso do adolescente, usar roupas de criança (tamanho pequeno); Não se pode confundir o tamanho, próprio da condição da doença; Há uma tendência à infantilização. Desde a infância até a adolescência sentem que sofrem muitas privações;
- No domínio do nível de independência: demora na obtenção da autonomia devido aos cuidados dos pais. Na visão dos adolescentes há um cerceamento pela preocupação das fraturas. No entanto, através dos depoimentos revelados, percebeu-se que têm consciência do que podem e do que não podem fazer ("o que posso fazer sozinho, o que não posso fazer e o que posso fazer com ajuda"); Consideram, em sua maioria, que levam uma vida normal; Muitos consideram que seus pais os limitam mais que a doença em si; Fica um alerta aos pais que facilitem a autonomia dos filhos.
- No Domínio do meio-ambiente: há que se melhorar o espaço físico (residencial e público); transportes públicos e particulares; as barreiras arquitetônicas urbanas (nos teatros, cinemas); Disponibilidade de informações (internet, redes sociais);
- Domínio psicológico (imagem corporal/auto-estima/identidade): igual a todos os adolescentes; Os jovens adolescentes e adultos não gostam da denominação (metáfora) da doença de ossos de cristal ou dos ossos frágeis; O resultado do tratamento reflete muito positivamente na vida dos adolescentes do grupo. Apesar da OI as experiências adolescentes são muito próximas dos não portadores de OI. A OI interfere muito na construção da imagem corporal/auto-estima/identidade, positiva ou negativamente;
- Domínio das relações sociais: Ressaltam a importância da família e muitos já vivenciaram algum tipo de preconceito fora e até na família; criação de estratégias para o enfrentamento do estigma: não falar sobre a sua condição (OI), evitando a superproteção, pena e etc. normalização de sua condição (testar limites físicos); ganhos secundários com a OI (tirar proveito de alguma situação); a vivência da sexualidade e o desejo da maternidade; Seguem-se diversos relatos dos adolescentes sobre estes aspectos.
- Conclusões:
Qualidade de vida – É um desfecho importante em saúde. É preciso pensar para além da dimensão física; existem poucos estudos com a faixa etária adolescente.
Grupo focal – 1ª. Experiência de participação com seus semelhantes, pois a maioria convive com jovens não portadores; Troca entre pessoas com a mesma faixa etária com a mesma condição e mesmas dificuldades;
Ressalta a importância de ser ouvido;
Identificação das prioridades para tratamentos futuros;
Adultos e adolescentes não gostam do nome "Ossos de Cristal", "Ossos de vidro". Acham pejorativo. Ao longo do tempo o termo se tornou pejorativo e inadequado tal como foi com o termo mongolismo/mongolóide para os portadores da síndrome de Down.
Finalização para debates;
Na 2ª parte da reunião, há uma abertura para a dinâmica de grupo coordenada por Fátima Benincaza e denominada por ela de Crachá Criativo, na qual cada participante representa no papel, através de um desenho, o momento que está vivendo. Após desenhar, o participante é convidado a falar sobre o desenho. Abre para o próprio depoimento e, depois, convida os participantes para a próxima apresentação; A maioria faz suas apresentações/depoimentos sobre os seus desenhos que representam em sua grande parte a luta particular de cada familiar na busca do conhecimento sobre a síndrome e tratamento do familiar portador de OI. Retratam também as alegrias, tristezas e sustos decorrentes da busca pela autonomia do portador de OI. Grande parte dos depoimentos são positivos, de superação de fé e de desabafo, convidando a reflexão, inclusive, sobre as ações dos não portadores na convivência diária. Há um reconhecimento generalizado de que sem o apoio do grupo, do núcleo RJ da ABOI, do IFF não teriam superar todas as dificuldades decorrentes da OI.
Ao final ela pergunta se foi difícil comentar sobre o que foi desenhado (falar de si próprio). Um "varal" é estendido com todos os desenhos, que poderiam ser observados durante o intervalo; também foi entregue a cada participante que quisesse, um papel, no qual anotariam observações/assuntos acerca do que gostariam que fossem abordados na próxima encontro do Núcleo RJ em 2012.
Na 3ª parte acontece uma linda confraternização com Papai Noel.
Assistente Social
0 Comments:
Speak up your mind
Tell us what you're thinking... !