Acessibilidade e barreiras
arquitetônicas
No dia 26/08/21 tivemos um bate-papo pelo Zoom, com Idari Alves da
Silva, sobre Acessibilidade Arquitetônica. Idari trouxe questões e reflexões a
partir de sua experiência de trabalho e de vida, de sua participação efetiva na
área de acessibilidade, dos direitos humanos e da cidadania. Falou de sua
militância na Associação de Paraplégicos de Uberlândia, Minas Gerais, uma das
entidades mais antigas, da qual seu amigo Gilmar é fundador e, quando ainda não
se falava em acessibilidade, lá pelos idos de 1982.
Em 2001, Idari recebeu um convite da Prefeitura de Uberlândia para a
implantar na cidade, um plano de acessibilidade. Lá, já estava o Gilmar como funcionário
efetivo que veio a ser seu chefe, e que o ensinou bastante sobre “acessibilidade
arquitetônica a luz da Norma. ” A ABNT NBR 9050:2020 é a “Norma que estabelece
critérios e parâmetros técnicos a serem observados quanto ao projeto, construção,
instalação e adaptação do meio urbano e rural, e de edificações às condições de
acessibilidade. Sua aplicação visa proporcionar a utilização de maneira
autônoma, independente e segura do ambiente, edificações, mobiliário,
equipamentos urbanos e elementos à maior quantidade possível de pessoas,
independentemente de idade, estatura ou limitação de mobilidade ou percepção. ”
(abnt.org.br).
Idari conta que sabia muito da teoria, mas não como realizar. Então,
juntos fizeram o plano municipal de acessibilidade e implementaram o projeto. Em
2017 se aposentou. Não é funcionário público mas continuou o seu trabalho, em
cargo de confiança. Ao longo desses anos obteve muitas conquistas para a sua
cidade, na área de acessibilidade arquitetônica, e foi para falar delas que ele
nos convidou para este bate-papo também. O outro motivo foi notar que nos
grupos de pessoas com OI dos quais participa, pouco ou quase nunca se fala sobre
a acessibilidade, que considera de grande importância para todos.
Atualmente, em questão de direitos, Idari não vê como necessário a
criação de mais leis em favor das pessoas com deficiência, pois já estão
contempladas na LBI (Lei Brasileira de Inclusão), na Convenção da ONU sobre os
direitos das pessoas com deficiência, como também no Decreto no.
5296 que regulamenta as leis 10048 e 10098, que também tratam do tema. A
legislação sobre a pessoa com deficiência é federal e não precisa de concessões
ou favorecimentos de prefeitos. Em sua opinião, para se trabalhar com acessibilidade
é fundamental estudar muito a legislação, buscar conhecimento na ABNT (não é
boa, mas é o que se tem), estudar a Norma (NBR) e fazer um trabalho continuado
(política de governo). Para aquele que pretende trabalhar com políticas
públicas, é preciso que saiba que não terá dotação orçamentaria para
acessibilidade. É fundamental que tenha um bom transito em todas as Secretarias
(Obras públicas e as que contratam, de Planejamento urbano e urbanismo), por
exemplo.
A Prefeitura de uma cidade deve ter um órgão fiscalizador que seja capaz
de dar conta de obras, empreendimentos, novos, antigos, para que se adaptem e
garantam assim a plena acessibilidade, conforme determinado na legislação
federal e nas normas vigentes de acessibilidade. Tudo em uma cidade deve ser
plenamente acessível. Idari ressalta que toda cidade tem seus códigos
municipais (de obras, de transito, de posturas), seu Plano Diretor e, em cada
um deles a questão da acessibilidade pode e deve ser inserida. Nesse bate-papo,
tivemos também a participação de Gilmar, amigo de Idari que complementou que o
desconhecimento da NBR era uma questão muito corriqueira entre engenheiros, arquitetos
e construtores quando ele, em 1998, foi para a seção de acessibilidade da prefeitura.
Considera importante o conhecimento da NBR para exigir que sejam as normas
sejam cumpridas. A NBR está lá. Muitas coisas dela são desconsideradas, ou até consideradas
além, quando já se tem uma experiência. No entanto, ela, a norma, é a base para
que a acessibilidade arquitetônica e urbanística possa acontecer. É também
importante conhecer as necessidades individuais de cada segmento para que a NBR
possa atender de forma universal. Apesar de considerar as falhas da LBI em alguns
aspectos, e os decretos que vem depois, que são um pouco contraditórios, é
preciso estar alerta sobre isto. Para atender a um decreto, em muitos casos, por
exemplo corre-se o risco de ferir a lei e, portanto, os direitos constituídos
na lei. Gilmar cita o caso do Decreto
9451 que trouxe muitas dificuldades para pessoas com deficiência, na construção
de condomínios residenciais, o qual, beneficiou em muito os construtores, em
detrimento ao direito de moradia das pessoas com deficiência. Nesse decreto,
apartamentos pequenos (mais baratos) e, portanto, com preços mais baixos, não
precisam ter acessibilidade. Como fica a questão da moradia para a pessoa com
deficiência e de baixa renda? Idari cita a elaboração de uma proposta para um
projeto de construção de prédios de apartamentos com adaptabilidade reversível,
a qualquer tempo, conforme a necessidade do morador, sem ferir a estrutura
predial. Foi uma solução, que mobilizou uma ação do Conselho Municipal contra
uma grande construtora, na qual o respaldo do Ministério público foi
fundamental. É importante o estreitamento de relações entre os Conselhos
municipais, órgão municipal relacionado a acessibilidade, com o Ministério
Público (nas esferas municipal, estadual, federal, do trabalho no campo da
empregabilidade). O Ministério Público é o grande parceiro.
Conversamos bastante também sobre o transporte público para todos: os
ônibus com elevadores para cadeirantes. Falamos sobre calçadas, pisos podotáteis
(com ressalvas), semáforos com sistema assistivo de audição, e as rotas acessíveis
que nos fazem chegar a um lugar, sem serem interrompidas (início, meio e fim). De
que adianta uma praia, praça, escola acessível se não há também uma forma de
chegarmos até elas também acessível? Falamos também sobre turismo, bares,
hotéis, cinemas, teatros, restaurantes e de como a palavra “acessível” é
empregada muitas vezes de forma equivocada, para contemplar a lei, indicando
que aquele ambiente ou espaço é adequado a um cadeirante que queira, por
exemplo, utilizar o banheiro, transitar no quarto de hotel, ou ainda, utilizar
uma rampa de acesso a um prédio, uma escola. Nesses casos, são locais que não
cumprem o que determina a Norma. Apenas dão um “jeito”, que no fim das contas
são constrangedores e, pouco seguros de serem utilizados. Em todos esses casos,
a acessibilidade deve ser plena e, não apenas quanto ao deslocamento entre
ambientes. Trata-se de todos os recursos disponíveis para aquele segmento, que
a legislação garante a sua plena autonomia. Para Idari e Gilmar, em especial, e
para nós da associação, essas e tantas outras questões relacionadas a
acessibilidade arquitetônica, na realidade deveriam ser mais exploradas em
nossas conversas diárias, no WhatsApp das associações de pessoas com
deficiência, por exemplo. De qualquer forma, o debate é necessário nas
associações e para além delas. São questões e reivindicações que nós, pessoas
com deficiência e associações precisamos saber como exigir, a quem e como nos
reportar para a obtenção da acessibilidade plena. Tudo tem um percurso.
No caso de Uberlândia, conforme Idari menciona, é uma cidade com todas
as escolas, praças, hospitais, comercio e transporte coletivo acessíveis vem
inspirando outras cidades de outros estados e, até fora do país. Como foi feito? Como conseguiu fazer? Sabe-se
que sem dinheiro não se faz nada. Idari e Gilmar falam qual foi o caminho das
pedras, suas experiências nesse sentido e as questões políticas envolvidas.
Sobre municipalidade, quais são as que obtiveram bons resultados, recursos
e como a fórmula de sucesso pode ser extrapolada para as demais cidades? Gilmar
cita o excelente projeto/programa de regularização de calçadas de Cascavel, no
Paraná. São experiências, algumas inusitadas, que valem ser conhecidas e
aplicadas, quem sabe, em outras cidades do país. Gilmar ressalta que é muito
importante a parceria com o Ministério Público, mas principalmente, que os
conselhos e as associações sejam fortes. Os bons resultados da experiência em
Uberlândia, se deve a atuação dos Conselhos e as parcerias junto com as
instituições fortes dentro do município e o MP também, a partir de2002. Um
conselho não deve ser aquele que só reclama das coisas que não são feitas. É necessário
que este conselho tenha as comissões responsáveis pelos assuntos, ensinando ao
gestor público como fazer. Os conselhos devem ter esse papel muito importante
junto aos gestores municipais os auxiliando e alertando em suas temáticas.
Vimos o quão amplo e importante é o tema pois envolve o nosso cotidiano
e como lidamos com ele: na cidade onde moramos, no nosso bairro, a nossa
vizinhança. Assim como também, se trabalhamos ou não, se estudamos ou não, se
saímos de casa para ir ao shopping, cinema, museu, praia ou não...e por quê
não? Se todos nós temos esses direitos. Por que as oportunidades muitas vezes
não chegam? Será que é por conta dessa acessibilidade de qual falamos muito
pouco, que é mal aplicada, não exigida e desconhecida por muitos e,
principalmente, pelos que mais precisam?
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